B人BEL quer “dar visibilidade a pessoas marginalizadas na sociedade chinesa”
Organização liderada por portuguesa em Xangai criou programa educativo para filhos de trabalhadores migrantes. Através da arte, a B人BEL quer apoiar o processo de integração da população rural na grande metrópole.
Catarina Domingues
A Pirâmide B人BEL quer chegar a todos. E é isso mesmo que diz o nome da própria organização: o carácter人 (rén), que substitui o “A” na palavra “BABEL” significa “homem” ou “ser humano”. A B人BEL quer chegar, por exemplo, à Escola Primária Minban Weke (民办文河小学). É aí que estudam filhos de trabalhadores migrantes em Xangai. Todas as semanas, a organização vai ao encontro de 45 crianças, com idades compreendidas entre os 10 e os 12 anos, para pôr em prática um programa focado na educação e no desenvolvimento pessoal.
“A ideia é que estes alunos conheçam as suas potencialidades, entendam que a vida deles tem tanto valor como qualquer outra e que faz todo o sentido que potencializem qualquer que seja o seu interesse ou aptidão”, começa por contar ao EXTRAMUROS a portuguesa Maria de Azevedo Brito, co-fundadora do projecto.
A operar sem licença, muitas das escolas onde estudam os filhos dos trabalhadores migrantes foram encerradas e demolidas nos últimos anos. A decisão acabou por chamar a atenção para a discriminação da população rural e migrante na China. É que sem permissão para viver na cidade, esta comunidade está proibida de frequentar aí as escolas financiadas pelo Estado. “Ainda há um grande preconceito aqui para com as pessoas que vêm das zonas rurais”, nota a jovem de 27 anos, realçando que um dos objectivos da B人BEL passa por “combater a desumanização”: “Existe em muitos lados, de várias maneiras e às vezes de formas muito subtis”, considera.
Conta a portuguesa que é difícil prever o futuro deste projecto educativo. “É muito instável, porque não sabemos se daqui a um ano essa escola ainda existe”.
A acção da organização vai chegar ainda este mês às escolas internacionais. A ideia é juntar na mesma sala de aula alunos destes estabelecimentos e de outros como a Minban Weke, sentá-los à mesma mesa a conversar e a colaborar em projectos.
O objectivo, refere a responsável, é que este programa, que pretende “fomentar o sentido crítico e a criatividade”, deixe um dia de ser apenas uma actividade extracurricular e que passe a fazer parte do currículo das escolas públicas.
“A arte oferece um espaço mais neutro”
Aos 23 anos, Maria de Azevedo Brito, natural de Braga, trocou Portugal pela Turquia e por um estágio na área do Direito dos Refugiados. “Senti que, apesar de estar na área que me interessava, não estava a fazer o máximo que podia fazer, não era aí que eu podia ter o maior impacto, não era estando sentada num escritório”, relembra agora a jovem, que acabou por partir para Qingyuan, no norte da província de Guangdong, para se juntar a uma organização não-governamental que desenvolvia trabalho na área da educação.
A B人BEL nasceu pouco depois, já em Xangai, onde reside actualmente. Surgiu inicialmente como um projecto de amigos e contemplava a organização de um festival anual para “dar visibilidade a pessoas marginalizadas na sociedade chinesa, àquelas pessoas que habitualmente não conhecemos”.
Nesse primeiro evento, que recebeu apoio de uma ONG, organizaram-se tertúlias para contar histórias, conferências para discutir questões de género, sobre a migração ou necessidades especiais, e a exibição de curtas-metragens.
No centro de todas estas actividades, esteve sempre a arte. “A arte oferece um espaço mais neutro, que parece menos frontal, e é mais fácil através da escultura, da pintura ou da história ou do teatro viver certas situações que se passaram connosco, expressar sentimentos, comunicar”, salienta a jovem.
A partir daí o projecto foi ganhando forma. Foi pelas mãos de Maria de Azevedo Brito e de Rose Dekker, co-fundadora, que a organização chegou à internet (www.pyramidbabel), às redes sociais e que começou a procurar formas de “ter um impacto mais directo”, nomeadamente através do projecto educativo nas escolas para filhos de trabalhadores migrantes.
Em Julho de 2018, a B人BEL organizou o primeiro Campo de Verão, que teve lugar na província de Henan e que se focou em temas como a confiança, criatividade e a capacitação dos mais novos. Nesse mesmo mês, o Festival Critica lançou o debate sobre o impacto social conferido à arte, através de masterclasses, exibições de filmes e tertúlias.
Já com um ano de actividade, a organização está também a apostar na área multimédia, com a publicação de histórias e de vídeos online e a criação de uma revista, que tem data de lançamento marcada para 23 de Dezembro deste ano.
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